segunda-feira, 22 de novembro de 2010

MÉTIER













caminhei do morumbi até a ponte eusébio matoso.
os táxis estavam pela hora da morte, e mesmo assim já estavam ocupados.
caminhei muito. eu ia passando os blocos de beatlemaníacos em cacos, que se jogavam nas calçadas exaustos à espera de um ônibus que já vinha lotado.

eu tava tão cansado e sonado que me assustei com minha própria energia.
eu devia ter sido derrotado por lou reed e pavement e pela cervejaria devassa, mas ainda estava insistindo em ir adiante.
todo mundo foi ficando para trás, exceto um casal carioca de shorts que tinha as batatas da perna muito fortes - provavelmente dois tarados do cooper de ipanema.
eles mantinham a dianteira com um ritmo marcial. levei até pelo lado pessoal, só podiam estar querendo me humilhar. justamente por isso eu não desisti, encarei a ultrapassagem como um novo desafio.

as imagens de tudo ainda muito frescas iam me acompanhando na travessia. 15 minutos após o ex-beatle ter saído do palco, dois homens com aspiradores já sopravam para o fosso o papel picado que integrava a chuva com a qual ele saiu do palco. eu via o homem apressado se livrando do papel picado que fizera o delírio da multidão uns minutos antes e os telões apagados e uns garotos vestidos como os beatles em sgt. pepper's com as roupas já em frangalhos saindo pela esquerda.

"obrigado, paulistas! obrigado, paulistas!, obrigado, paulistas!", repetia paul na minha cabeça incessantemente.
passei o casal de cariocas já quase na ponte, mas entrei em pânico quando percebi que iam me passar novamente. as pernas tavam falhando. vi um táxi com a luz acesa e acenei, ele me disse para entrar. senti estranha satisfação em largar os "competidores" pra trás, melhor abandonar a competição do que perder. rarará!

um resto de feijões brancos com ovos, uma coca gelada e eu já tinha esquecido o terror que foi o hambúrguer da tok take alimentação, que fornecia aquelas coisas que estavam vendendo no morumbi.




acho que é a proximidade de dezembro e do meu aniversário e do natal que fazem com que eu me recorde de coisas melancólicas. mas nenhuma veio tão rápida como esse poema aqui do beatnik gary snyder, do qual reproduzo um trecho.

We had what the others
All crave and seek for
We left it behind at nineteen

I feel ancient, as though I had
Lived many lives.

And may never now know
If I am a fool
Or have done what my
karma demands.




Tivemos aquilo pelo qual os outros
ansiaram e desejaram
Deixamos tudo pra trás aos dezenove

Me sinto velho, como se tivesse
vivido muitas vidas

E talvez nunca venha a saber
Se sou um tolo
Ou se fiz aquilo que
meu karma determina


(december at yase, gary snyder)

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito legal o post, Jota...
Abração, Marco