sexta-feira, 10 de setembro de 2010

STACEY


foto: leonardo soares/AE









Deslumbrante. Amorosa. Fofa. Elegante. Poderosa. Delicada. Adorável.

Os adjetivos caíam como confetti sobre o palco do Via Funchal na noite de ontem, enquanto Stacey Kent contava para o público a história de como estudou português arduamente nos últimos dois anos. “E por quê?”, perguntou a si mesma, como se respondesse a um interlocutor imaginário. Porque sonhava em decifrar o significado das palavras de músicas como Desde que o Samba é Samba (Caetano Veloso) e Corcovado (Tom Jobim).

Essas duas canções foram algumas das 17 músicas que a cantora apresentou (em português) no seu retorno ao Brasil ontem à noite, acompanhada de um quarteto (no qual pontifica o saxofonista Jim Tomlinson, também marido da artista). Tomlinson fazia aniversário na mesma noite, e a mulher lhe dedicou uma canção, The Ice Hotel (de autoria do próprio e do escritor Kazuo Ishiguro). Mais ainda: permitiu que Tomlinson fizesse um número sozinho, e ele escolheu “uma música que foi composta no ano em que nasci, 1966, de Burt Bacharach e Hal David: Alfie”. Suave momento.

Stacey abriu a noite com Les Eaux de Mars, a versão que Georges Moustaki fez para o francês de Águas de Março, de Tom Jobim. Dali em diante, ela só voltaria à música brasileira com Corcovado/Quiet Nights, ao violão, alternando as versões em português e inglês e declarando que João Gilberto é um dos artistas que mais admira no mundo todo.

Tudo poderia parecer meio clichê reverente de gringo, mas Stacey exala sinceridade e modéstia artística quando fala de suas referências musicais. “Creio que todo mundo deveria aprender português um dia”, afirmou. Ri de si mesma, de sua própria ousadia cultural.
Stacey é uma lufada de ar fresco passando por cima de standards do jazz, como It Might As Well Be Spring e The Surrey with the Fringe on Top (ambas de Rodgers e Hammerstein), So Many Stars(Sergio Mendes e A. Bergman).

Para Stacey, a música só se justifica por apegos emocionais. Ela contou como o avô, russo que emigrou para Paris, lhe ensinou o francês desde menina, e que foi daí que adveio a decisão de gravar seu novo disco, Raconte moi, todo com canções em francês. Para se compreender plenamente um idioma, disse-lhe o avô, seria preciso compreender primeiro o som da poesia daquele idioma, daí a demora. Mas o sentimental também passa por escolhas intelectuais: em vez de se ater somente aos standards da chanson française, ela foi em busca também dos novos compositores, como Keren Ann e Benjamin Biolay (de quem cantou Jardin D’Hiver).

Canções do disco Breakfast on the Morning Tram foram ficando para a segunda metade do set, como Samba Saravah (Baden Powell/Pierre Barouh), What a Wonderful World (R. Theile e G.D. Weiss) e a própria faixa-título, também composta por Kazuo Ishiguro e Jim Tomlinson. As canções em francês amansavam aflições, como a bela L’Étang (Paul Misraki) e Raconte Moi (Emilie Satt, Bernie Beaupere e Jean Karl Lucas).

Ela ainda tinha planejado cantar Coração Vagabundo, também de Caetano Veloso, mas pode ser que tenha reservado essa para o show deste sábado no Rio de Janeiro. Cantou música que alguém lhe pediu pelo Facebook, cantou música que a plateia pediu. Quando Stacey terminou a noite, como You’ve Got a Friend(Carole King), What a Wonderful World (R. Theile/G.D.Weiss) e Que Reste-t-il de Nous Amour (Charles Trenet), o clima era de rendição total. É uma das cantoras que redefiniu a noção de artesanato no jazz moderno.

Antes de Stacey, apresentou-se o bom grupo jazzístico gaúcho Delicatessen, que canta standards jazzísticos.

6 comentários:

Anônimo disse...

JB, assisti ela cantando Coração Vagabundo no Programa do Jô. Do caralho. Ela me lembra a Tracey Horn (é assim que se escreve? é ela do everything but the girl? fiquei com preguiça de ir ao google).

Abraço,

alemão

el pájaro que come piedra disse...

É ela mesma, a Tracey Horn. Boa comparação, eu não lembrei dessa. Ela é muito original, e a voz é agradabilíssima! Além de ser muito fina.

Anônimo disse...

Caro Jotabê,
Também assisti a entrevista que ela deu ao Jô Soares~. Não a conhecia, fiquei emocionado e encantado exatamente com o que tu falaste. A sinceridade da guria falando sobre o João Gilberto, sobre o Caetano, sobre o pq aprender o português. Foi lindo mesmo ela cantando Coração Vagabundo. A entrevista foi curta, muito curta, mas valeu por tê-la conhecido.
Abraço Colorado!

Carlos Pereira

Rê Gallo disse...

Que inveja de vc, Jeibi! Queria muito ter ido. Está aí uma coisa que me faz bem, ouvir a voz da Stacey Kent.
Bjão.

nana tucci disse...

Stacey CAN

Anônimo disse...

eu a vi no jô aquele sujeito que só sabe falar de si mesmo, mas enfim me apaixonei