segunda-feira, 22 de setembro de 2008

MEG BOCA DE CAÇAPA


Era tão feia, mas tão feia, que (diz a lenda) quando sorria para alguém (e ela raramente sorria), imediatamente nascia uma verruga na bunda da vítima. Seu apelido, segundo historiadores, era Meg Boca de Caçapa.

A austríaca Margarete Maultasch (1318-1369) foi a última Condessa do Tirol, da dinastia Meinhardiner. Era filha de Henry, duque de Carinthia e Conde do Tirol, o qual ela sucedeu em 1335.

No princípio do século 14, quando era ainda apenas um bebê, já tinha recebido as primeiras propostas de casamento. Seu dote, apesar da feiúra crônica, deixava babando os nobres da Europa.
Nos arquivos do Estado, achei esse texto sobre Meg publicado no Jornal da Tarde em 16 de outubro de 1969:

“Com 12 anos, Margaret casou-se com um príncipe (descobri depois que era John Henry, da Boêmia, filho de John, Conde de Luxemburgo, em 1330). Um dia, cansou-se dele: o marido, ao voltar da caçada, encontrou fechados os portões do castelo. Margaret, do alto de uma torre, gritava que não queria mais vê-lo e fazia um convite: ele deveria deixar o País o mais depressa possível”.

O segundo marido era filho de Luis, o Bávaro. O temerário Luis V da Bavária ficou noivo de Meg, mas para casarem ela tinha de cancelar seu primeiro casamento. A solução era fazer o Papa cooperar. Até que tudo ia bem: três bispos foram enviados ao Tirol para a missão de anular o compromisso, mas na viagem, no Vale do Meran, uma avalanche matou um dos bispos. Os outros dois bispos acharam que tudo aquilo era um castigo dos céus e fugiram.

Então, um simples capelão foi escalado para anular o casamento e Meg enfim casou, sendo depois excomungada pelo Papa Bento 12 e protagonizando o primeiro “casamento civil” da Europa. Foi na propaganda eclesiástica que ela recebeu o apelido Maultasch (que resulta em algo parecido com o nosso “Boca de Caçapa”).

Mas, logo logo, em 1334, ela também se cansou do segundo marido e até do filho que tiveram, Meinhard, e há indícios de que os tenha envenenado, tornando-se rainha absoluta da Boêmia e do Tirol. Logo a seguir, pressionada pela insatisfação do povo e da nobreza, unidos, ela abdicou.

Dizem que Meg era voraz: papava jovens camponeses fortes e bonitões oferecendo-lhes presentes e favores. Foi a primeira mulher cuja figura pública era imediatamente associada a poder e crueldade, mas o que será verdade nessa história? O que é verdade é que ela tinha uma bocarra, um duto capaz de relegar ao papel de canudinho o bocão de Cicarelli.

Meg Boca de Caçapa ficou tão famosa que foi pintada por Leonardo da Vinci e Quentin Matsys (retrato acima). Seu retrato foi modelo para o personagem A Duquesa, que o ilustrador Sir John Tenniel fez para Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Lion Feuchtwanger baseou-se em sua história para escrever o romance A Duquesa Feia.
Um dia sonhei escrever um romance semificcional sobre a vida de Meg, A Feia. Poderia ter começado assim:

"Era um castelo que não tinha espelhos, nem lagos, nem banheiras, e os vitrais eram de vidro transparente. Não tinha prataria: todos os pratos eram de louça branca. Nada refletia imagem alguma no Reino de Meg, a Feia, porque tudo que ela não queria na vida era enxergar-se inadvertidamente". Eu colocaria palavras na boca dos seus amantes, como Elio Gaspari teria feito com Joaosinho Trinta ("Pobre gosta é de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual"). Por exemplo: diria que foi naquela época que se inventaram frases como: "Só vou se puserem um travesseiro na cara dessa mulher". Ou então: "Se me virem conversando com Meg Boca de Caçapa, podem apartar que é briga".

Desisti, mas compartilho com vocês o meu terrível bloco de anotações.





publicado originalmente no blog antigo em novembro de 2006

Um comentário:

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