Muitos anos depois do auge deles, descobri uma palavra em inglês que os definia com perfeição: cartoonish.
Uma música moldada pela admissão de personagens, senso de humor nonsense, um escracho cavalheiresco. Música cartunística.
Havia 27 anos que eu tinha ido a um show deles pela última vez. Tinha sido no pequeno auditório do MASP, eu tinha um bebê dormindo nos braços e por isso fiquei em pé lá no fundo (para poder sair emergencialmente).
Foi delicioso descobrir, em quase duas horas de show, que havia mais toada sertaneja e moda de viola no som dos Mulheres Negras do que cultura B, fliperama e Godzilla.
Monstros Japoneses. Mãos Coloridas. Purquá Mecê. Milho. Imbarueri. Rico e Xarope: nada ficou velho. Pelo contrário: ficou novo. Como na sutileza de haicai da letra de Imbarueri, que campeia o que São Paulo tem de contrastante (taba eletrônica que ainda acolhe o índio tupi e o lobo guará), e que recebe tratamento de artesanato.
Eles anteciparam as drum machines no pop nacional com artefatos primitivos paraguaios, mas hoje, numa época em que esses truques estão disseminados com máquinas perfeitas, esses gadgets perderam espaço para sua própria excelência musical.
Os esquetes cênicos de Os Mulheres Negras são, na verdade, iscas para cooptar a plateia, para conduzi-la a uma música sofisticada, não raro de construção difícil, vanguardista.
A maturidade deu a Andre Abujamra um domínio e um timing perfeito da guitarra. Maurício Pereira, o Buster Keaton da dupla, cuida da parte mais exaustiva da interatividade, outra de suas inovações nos anos 1980. Pereira faz sua parte no negócio quase sem esforço, com uma tal leveza que parece um Woody Allen em férias. Ou um "professor de cursinho", como ele mesmo brincou.
Mais ou menos sem esforço: chegaram a Belém na hora da passagem de som, depois do almoço, depois tocaram até meia-noite e embarcaram de volta para SP às 4h da madrugada. Como ralam esses desbravadores.
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