Manoel Poladian e o Andre Rieu de Papelão, sua mina de ouro, atrás dele: faro inato para os bons negócios
Desde 1958 na ativa, Manoel Poladian desenvolveu know-how em promover shows e festivais e em empresariar artistas e já prepara a terceira geração de poladians
Em seu
escritório na região da Berrini, em São Paulo, há em todas as
janelas
um pires com um punhado de sal grosso e cabeças de alho. Filho de um fotógrafo e uma dona de casa armênios que
imigraram para o Brasil em meio à Segunda Guerra Mundial, o empresário Manoel
Poladian não crê em bruxas, mas prudentemente as teme. Aos 72 anos, ele é um controverso pioneiro do showbiz nacional. Há quem o
tenha como um padrinho, outros como um cappo.
Poladian foi o empresário que inaugurou recordes de público
no Brasil no início dos anos 1970, época em que realizou o musical Uma Noite em Buenos Aires,
com Astor Piazzola, Mariano Mores, Jorge Sobral e os maiores nomes do tango.
Foi 1,5 milhão de ingressos vendidos e 175 shows no Anhembi, em São Paulo.
Mas Poladian já era um veterano, àquela altura. Em 1958, com
apenas 16 anos, conseguira emancipação da família e ganhava a vida como
comediante na televisão em programas como Grandes Atrações Pirani Philco, na TV
Tupi. Tinha uma trupe de piadistas batizada como Os Boçais. Achava-se engraçado e independente. Mas o pai deu-lhe
uma surra de chinelo bumerangue, conta, para que largasse o vício artístico. “Nesse
meio, ou você é puta ou é viado”, ralhava o velho Manuk.
Em 1961, já com 19 anos, para fugir ao confronto, ele realizara parcialmente o desejo
do pai: entrara em Direito no Mackenzie. “Era o auge da bossa nova. Vinicius
tinha dito que São Paulo era o túmulo do samba, e aquilo me deu uma ideia.
Resolvi fazer um festival universitário”. Criou o Festival da Balança, cujo
elenco, já na primeira edição no Teatro Mackenzie, era invejável: o próprio
Vinicius, Baden Powell, Silvinha Teles, Luiz Bonfá, Tamba Trio, Dick Farney,
Lúcio Alves. Três mil pessoas encheram um espaço onde só cabiam 1,5 mil, havia
gente pendurada na sacada, nos corredores, em pé.
O Festival da Balança e suas edições subseqüentes eram
beneficentes e foram o embrião dos festivais de arena que vieram depois. O
refrigerante Crush! bancava os cartazes, que ele colava pela cidade. “Esses
caras acham que inventaram o marketing, mas quem inventou fui eu”. Com espírito
de comerciante, Poladian virou celebridade na universidade. Seu amigo Taiguara compôs o
jingle da candidatura dele ao Centro Acadêmico.
Ele então encorajou-se a fazer novas edições, mas em 1962 e
1963, havia um problema: com que elenco? “Foi um ano péssimo, porque a bossa
nova estava estourando no Exterior, tinha os famosos shows no Carnegie Hall e
estava todo mundo viajando”, lembra. Silvinha Teles o salvou. “Tem um cara lá
no Beco das Garrafas que é um assombro”, lhe disse. Foram atrás do sujeito:
Jorge Ben. Foi assim que Jorge Benjor acabou fazendo seu primeiro show em São
Paulo. “Tive que alugar um smoking pra ele lá na Rua Pamplona, porque não tinha
nem terno”, conta Poladian.
Hebe Camargo foi a apresentadora daquele Festival da
Balança. Tinha tanta gente querendo se apresentar que Poladian teve que dizer
não para alguns postulantes. Dois deles: Lennie Dale e um jovem Chico Buarque
de Hollanda. “Não deixei. Chico ficou na porta, não o deixei cantar porque já
estava com quatro horas de show. Também, nem sabia quem era, sabia apenas que
vinha da USP”, lembra o veterano.
Dali em diante, Poladian desenvolveu um know-how em promoção
e realização de shows que o projetaria nesses 54 anos de carreira. Em 1965, fez
um grande festival no Clube Pinheiros, com 8 mil espectadores, com Elis, Nara
Leão, Jô Soares, Edu Lobo, Baden Powell, Vinicius. Sua fama provocou disputa. “Um
dia, vieram me dizer que havia três baianos na porta do meu escritório. Mandei
entrar. Eram Caetano, Gil e Bethânia”, conta. Passou a empresariá-los durante
toda a década de 70, realizava cerca de 80 a 100 shows por ano. “Apresentei
Flora a Gil. Ela vendia ingressos para mim”, lembra.
Em 1972, foi contratado pela TV Globo e realizou shows de
Mungo Jerry, Wilson Pickett, Demis Roussos, Santabarbara. Sua carreira
internacionalizou-se. Em 1975, virou empresário do maestro Ray Conniff, que não
fazia shows com outro empresário. Realizou mais de 200 shows de Conniff, em 15
temporadas. Fez shows de James Taylor no Parque Antarctica. Colocou 189 mil
pessoas no Maracanã para ver Sting (a capacidade era de 100 mil). Hoje, é o
empresário de outro fenômeno de público, Andre Rieu (35 shows lotados no
Anhembi, com 8 mil pessoas em cada espetáculo).
A solidificação da indústria musical no País ampliou sua
influência. Ficou 18 anos com Ney Matogrosso, capitaneou o sucesso do RPM (182
shows em 7 meses no ano de 1985, com 3 milhões de espectadores). Tem poucas
mágoas no ramo. Daniela Mercury, que rompeu contrato com ele dois anos antes do
final, é uma delas. “Nunca fale de um artista para outro, porque eles têm uma
vaidade incrível”, afirma. Outra de suas boutades: “Os caras grandes
reconhecem, os pequenos não”, diz. “Sempre paguei na segunda-feira. Nunca
atrasei um dia, razão pela qual nunca me processaram”.
É possível dizer que Poladian
nivelou o chão de terra batida
no qual os empresários atuais colocaram asfalto. Ele continua em plena
atividade, embora tenha delegado a dois de seus três filhos as funções
de gestão dos negócios. Um dos dois netos, Gabriel,
de 11 anos, ensaia seus primeiros passos no métier empresariando um
clown.
Manoel Poladian segue o conselho do seu amigo,
o chansonnier franco-armênio Charles Aznavour, 92 anos, que também empresaria
(virá de novo no ano que vem): “Parar é a antecâmara da morte”, cita,
adiantando que já pensa em escrever sua autobiografia. Vai ser um salseiro,
porque Poladian não é um homem de meias palavras. “Aos 72 anos, posso falar o
que quiser sem medo das conseqüências”, diz ele.
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