sexta-feira, 17 de agosto de 2012

DOIS FILMES






Fui ver o filme Rock of Ages.

Tem um momento em que os protagonistas, que almejam se tornarem músicos, se reencontram após um tempo separados.

Ela não conseguiu se tornar cantora, está trabalhando num inferninho.

Ela diz pra ele: “Tenho de te confessar algo. Estou trabalhando como stripper no Clube Venus”.

Ele diz pra ela: “Tenho de te confessar algo também. Eu não estou numa banda de rock, estou cantando numa boys band”.

Aí ela conclui: “É, isso é muito pior!”.



Nos desvãos de sua atmosfera kitsch e do arcabouço edulcorado, Rock of Ages é um filme interessante. Falei sobre isso em uma palestra essa semana no Espaço Cult.

Primeiro, porque Rock of Ages é um musical sobre um determinado período da música popular, o final dos anos 1980 e o predomínio do que chamávamos de rock farofa (o rock tipo Scorpions e aquelas músicas tipo Still Loving You, baladas que Axl Rose, Sebastian Bach, Extreme, Poison, Journey, etc, tornaram famosas). Desde Grease que eu não via algo do tipo no cinema.

Uma das características de nossa época é que ela não permite mais esse contorno comportamental. Até os anos 1990, era perfeitamente possível identificar essa geografia cênica de um tempo. Os anos 1990 poderiam perfeitamente serem definidos como a era dos DJs superstars, Fatboy Slim, Aphex Twin, a eletrônica do Daft Punk.

Já a primeira década do século 21 não oferece essa possibilidade. Para representar os anos de 2001 a 2011, você apostaria em quem? Strokes? Kings of Leon?

Que cantora, que música vocês poderiam dizer que representa esse tempo que estamos vivendo agora? Lady Gaga? Não creio, ela é um fenômeno pós-moderno, uma colagem de muitas coisas que a antecederam, começando pela própria Madonna, pelas coreografias de Beyoncé e Britney. Sua aparente autocrítica se dilui em sua fome de monstro pop.

Acho que uma das características desse nosso tempo é uma prevalência da ideia de combinações matemáticas na música, vivemos num grande mash up. O festival Sónar mostrou um pouco isso, a cristalização de certos fenômenos (Justice, Kraftwerk, James Murphy), novidades de um tempo já perdido.

Assim sendo, a questão é: que tipo de trabalho teria o jornalista de cultura pop nesse ambiente? É um aparente contrassenso: tantos anos depois, e o jornal (e a revista) ainda concentra o debate político, cultural, científico, comportamental. Concentra, mas não reflete, não desvenda, não elucida. Parece mais um grande depósito de esperanças do que um ambiente de clareamento.

"Na idade de ouro do jornalismo cultural, as pessoas queriam saber sobre os rock stars: quem eram eles, o que eles pensavam, como viviam. Nesse tempo, o jornalista de cultura pop era o emissário que ia buscar essas informações. Mas agora o fã não precisa mais dessa intermediação. O rock star se expõe por meio do Twitter, do Facebook, dos blogs. É de fato um novo mundo, mas há um problema: agora, eles mostram apenas o que querem mostrar".
Quem disse isso foi NEIL STRAUSS (jornalista da Rolling Stone e do New York Times), no livro Everyone Loves You When You're Dead - Journeys into Fame and Madness (HarperCollins).



ON THE ROAD &


a primeira cena em que o jazz aparece em “on the road”, de walter salles, já me desanimou.

um club de jazz dos anos 1940 em que todo mundo era magro, todo mundo tinha todos os dentes, todas as roupas eram bem escovadas e brilhantes?

continuei vendo o filme, mas já sem grande interesse.

“é só um filme”, disse minha sobrinha michelle, a melhor definição que ouvi. não é lisonjeira, não podia ser "só um filme".

quando o sal paradise dança com a namorada do homem-aranha ao som de i’ve got the world on a string, de ella fitzgerald, eu não achei bonito, achei meio classe média, desprovido de atmosfera, de vertigem.

piorou ainda mais quando foi a hora de yep roc heresy, do slim gaillard.

faltava o batismo da sarjeta àquelas cena de jazz, estava tudo certinho, tudo asséptico como cartaz de show de musical da brigadeiro luis antonio.

foi indo por aí.

o walter salles acentuou demais a atmosfera brokeback mountain.

havia de fato o componente homerótico, o neal cassady gostava de meninos & meninas, etc.

mas o filme acabou virando um brokeback mountain beat.

as motivações literárias e intelectuais passam por ali de forma superficial.

allen ginsberg parece meio debiloide em sua iniciação poética. ok, burroughs pareceu um pouco mais fora de controle, mas ainda assim é puro verniz.

na máquina de escrever de sal paradise, o livro de jack kerouac acaba se fazendo como que por “mágica”. walter salles aceita a lenda.

no final, a última aparição de dean moriarty me deu pena, mas porque o diretor nos obriga a sentir pena dele?

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